terça-feira, 25 de outubro de 2011

"Se não for isso, o que será?"

Em apoio ao projeto Pasárgada.


Todos sabem. Nasci em Porto Alegre, mas cresci em Santa Catarina.
Foi em Criciúma - uma cidade de médio porte - e Balneário Gaivota - prainha semi-deserta, exatamente no fim do mundo - onde criei amizades, onde cursei o colégio e onde aprendi a ser gente.

Nos anos que vivi em Santa Catarina, aprendi as coisas do currículo de lá. Sei onde fica Xanxerê, mas me perco quando perguntam onde fica Passo Fundo.

Porém, Porto Alegre NUNCA saiu da minha mente. Tanto que, bastou ter uma remota possibilidade e eis-me aqui, em Novo Hamburgo, a um mísero passo de voltar a morar na cidade que tanto amo. Não, não sou Gaúcho, sou Porto-Alegrense.

Há uma passagem engraçada em que, certa vez, fui ao Gigante da Beira Rio, assistir a um jogo do Internacional. Lá pelas tantas, a torcida começou a entoar um canto, que eu não conhecia, mas que achei LINDO. Diziam os versos, que assimilei rapidamente: "Sirvam, nossas façanhas, de modelo, à toda Terra!"

Ao acabar o canto, virei, visivelmente emocionado, para o torcedor ao meu lado e exclamei: "Como a torcida do Inter cria músicas tão legais para cantar no estádio!"
Recebi, como resposta: "Isso é o Hino do Rio Grande, animal!"

...

Tenho a música no meu MP3, e sempre me emociono ao escutá-la.

Porque será?

Historicamente, as pessoas possuem um vínculo com a terra onde nascem, vivem. 
Já escutei várias teorias a respeito do porquê disso.
Uma delas, se baseia em que "somos o que comemos". Nossa comida se alimenta dos nutrientes da terra, a nós nos alimentamos dessa comida. Logo, nós somos a terra que vivemos. Não sei bem como isso se encaixa no contexto atual de mercado globalizado. Mas a ideia não me parece tão insana.
Também já ouvi falar que há ligação com o local através do processo cultural de culto aos mortos e seus locais de sepultamento. Pessoas tendem a ficarem próximas dos locais onde seus parentes estão enterrados. Acho essa teoria meio furada, mesmo porque eu jamais tive vontade de visitar túmulos de parentes. Somado ao fato de que as pessoas mais velhas - com menos expectativa de vida - serem as mais apegadas a temas de vida após a morte e não conseguirem viajar com o mesmo vigor de anos mais jovens, só posso concluir que isso é mais um estágio da vida de certas pessoas do que, propriamente, um fato da vida.

Enfim, o que quer que nos prenda ao lugar que moramos, é inegável que temos uma associação forte ao local de nossa origem.
Reservo essa ideia para o final da receita.

Vou unir, aqui, o instinto humano. Imprescindível, ao meu ver. 
Mulheres são sedentárias. Elas, por carecerem de constituição física, na maioria dos casos, precisam da segurança que um grande número oferece. Aliado a isso, são elas quem carregam as crias, o que só as torna mais vulneráveis, precisando de um local seguro para poderem viver.
Na contramão do instinto, temos os homens, que precisam, a todo momento, provar o seu valor para, então, conquistar as fêmeas. Lembrem-se elas escolhem o melhor pai para o seu filho, pois podem ter poucos filhos durante a vida, em comparação. Assim, os homens aprendem a se aventurar, desbravar, buscar por novos desafios, espaços.
Em resumo: Nós, homens, temos, no cérebro reptiliano, o desejo de entrarmos em caravelas ou capsulas espaciais e descobrirmos novos mundos.

Então a dualidade foi instituída. Por um lado, gostamos de manter a tradição, montar o acampamento e defender a terra que amamos. Por outro lado, o horizonte convoca a caminhada, rumo ao desconhecido.

O que fazer?

Bem, é complicado responder ainda mais tendo o Brasil como lugar envolvido no assunto.
Cada lugar do mundo tem suas características, que atraem ou repelem as pessoas.
Nosso pais é, talvez, o que possa despertar maior discussão a respeito de "ir ou ficar"?

Os que quiserem ir, provavelmente, começarão a argumentação com a desassistência do nosso Estado para com os cidadãos, fruto da corrupção que nos assola. Eu vou mais além. Se eu fosse embora do Brasil, o faria pelo que origina a corrupção: a porcaria do "jeitinho brasileiro". Aquele que todos condenam e praticam, no maior exercício de hipocrisia que pode ser catalogado pela história humana. Marchamos contra a corrupção, saímos com as caras-pintadas, exigimos diretas já, nos revoltamos contra tudo e contra todos, só pelo direito ao nosso jeitinho brasileiro. "Venha se dar bem você também". Queres algo de um brasileiro? Faça parecer maracutaia. O negócio pode ser o mais honesto e laborioso que existe. Se for travestido de maracutaia, o povão adere. E gosta. E difunde. E, em pouco tempo, a porcaria do "Lojão de 1,99" está em todas as esquinas.
Essa porcaria de "jeitinho Brasileiro" é o que faz com que as pessoas não se importem com o patrimônio público. Se eu me importar, estarei perdendo meu tempo cuidando do que é de todos... 
Assim, acontecem cenas como a que presenciei domingo: "patyzinha", de roupinha da moda e fedendo a perfume a rua inteira, joga o papelzinho da balinha a 3 passos de uma lixeira. E ainda tem marmanjo que vem com a desculpa esfarrapada que "se não jogar lixo na rua, não tem serviço para os garis". Como diz a resposta clássica, morre e dá serviço para o coveiro, logo!
Não admira a internet ser o sucesso que é, no Brasil. Terra sem lei é nossa praia, mesmo.
Toda essa vontade de subir na vida sem esforço já nos torna corruptores desde sempre. E dos poucos que se recusam a serem corruptores, acabam corrompidos. E a parcela ínfima que sobra acabam como eternos frustrados, ermitões desse mar de lama.

Claro que tem gente que acha esse panorama um absurdo.
Exaltam a alegria, receptividade, permissividade, liberdade, economia, etc...
Sabe que até concordo com algumas partes?
Por exemplo, a parte econômica. Sempre ri muito das histórias das pessoas que iam para os EUA trabalharem em sub-sub empregos, dois turnos por dia, alugavam uma caminha em um albergue coletivo, mal tinham as roupas do trabalho, não saiam, não faziam festa, economizavam cada centavo que ganhavam... e, depois de anos passando o inferno nos EUA, voltavam para o Brasil com grana suficiente para comprar um carro, uma casa ou montar um negócio.
Sinceramente, nas mesmas condições, o resultado, aqui no Brasil, é o mesmo. Experimente passar anos trabalhando muito e gastando o mínimo indispensável para viver, no Brasil. Você terá o mesmo carro, casa ou negócio...
Diria eu: de modo cartesiano.
Nós estamos, também, acostumados a um nível absurdo de liberdade. Aliás, quem me conhece já sabe que nem utilizo mais esse termo, porque o conceito de "liberdade" exige compromisso, regras a cumprir e que, em qualquer momento, o alvo tenha estado "preso". No Brasil, não sabemos o que é estar - realmente - sitiado. Nunca fomos submetidos a privações desumanas. Há quem seja saudoso do nosso pior momento: a ditadura! Em paralelo, nada fizemos, realmente, pela nossa "liberdade". Não lutamos, não nos revoltamos, não tiramos nossa bunda gorda do sofá. E, por fim, não reconhecemos a dívida de qualquer contrapartida para termos tanta liberdade. Logo, toda essa capacidade de fazer as coisas, sem o devido respeito e reverência para a mesma, torna nosso povo libertino. Sim, nossos tempos são os de libertinagem. Somos crianças cujos adultos responsáveis simplesmente sumiram. E não temos uma fadinha ou um grilo para nos dizer o que é certo ou errado.
Essa libertinagem nos faz mal acostumados. E não conseguimos suportar a responsabilidade da liberdade de outros países. Logo, nosso pais é único e belo por causa disso!

Por fim, encaro o lado filosófico.

Há diversas visões para a migração. Há quem veja a grama do vizinho mais verde e ache que o paraíso é logo ali, do outro lado da fronteira. Mas se esquece que, não importa onde se vá, você é o mesmo, sempre. E você muda o mundo à sua volta. O lugar novo deixa de ser novo em pouco tempo. Temos a incrível capacidade de transformar qualquer que seja o nosso meio na concepção de lar que temos.
Mudar de vida, mudar de ares, buscar novos desafios...

Pegando os ingredientes que preparei até agora, acho que temos um dever com o nosso chão. Não importa o quão longe vamos, sempre teremos nossa terra como referência. Como pode haver paz eterna no céu, se sabemos que algum ente querido está agonizando no inferno, não é?

Fiz questão de voltar para o meu chão, faço questão de corrigir a patyzinha mal-educada, quero minha cidade cada vez mais bonita, cada vez melhor e procuro passar os valores que creio serem os corretos.

Se eu sairia do meu Rio Grande amado para morar em outras plagas? Só em extremo caso de necessidade. Mas, mesmo assim, contrariado.

Um comentário:

  1. Eu não sei quanto a voltar as minhas origens, sou paranaense, lá de Andirá, cidade pequena, sem grandes pretensões, apesar de meus pais ainda viverem lá, não tenho saudade da terra, mas não menosprezo, nasci e fui criado lá, sou pé vermelho com orgulho. Talvez porque a projeção de trabalho seja muito pequena. E o desbravamento seja uma forma de rebeldia direcionada para a rotina estática das condições atuais, e sei que o desgaste me toma de assalto e está me adoecendo. Alias Rio Grande do Sul é uma ótima opção. obrigado.
    Adnan

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