quinta-feira, 26 de agosto de 2021

Sobre Identidade de gênero, faz de conta e proibir publicidade para crianças

Hoje eu deixei o Youtube correr livre.

Estava imerso em um trabalho e usei os vídeos como barulho de fundo para me isolar do mundo.

Um vídeo sucedeu outro e do nada caiu uma palestra do Jordan Peterson.

Não me entenda mal, eu não gosto desse cara. Não costumo consumir os vídeos dele. Mas eu escuto palestras o tempo todo e acabou que um perfil que mostra palestras que me interessam também subiu um vídeo do Peterson. Aí o algoritmo do Youtube largou o Peterson nos meus ouvidos.

E nesse vídeo o Peterson larga sua conclusão nos primeiros segundos. O tempo necessário para identificar "que porra de vídeo é esse?" foi o mesmo para receber a conclusão do vídeo. E a porcaria da conclusão do Peterson ficou na minha cabeça.

O tema dessa palestra do Peterson era sobre identidade de gênero. E ele utilizou uma precisão de laser para entregar sua conclusão: "eu não estou certo que as crianças foram encorajadas ou permitidas a brincar o suficiente nos últimos 25 ou 30 anos. E eu acho que muito dessa identidade de gênero é apenas brincar com fantasia. É prolongar a brincadeira com fantasias. Porque é o que você faz com sete anos de idade. "Eu tenho essa identidade!" Você brinca com situações imaginárias. E isso está ok para essa idade. E nessa idade você convida outras pessoas para brincar contigo. Você não obriga que os outros tenham compromisso com a sua fantasia. Você aprende a não chorar e reclamar quando os outros não brincam com a fantasia que você criou."

Bem. Novamente. Eu não sou um seguidor do Peterson. Acho a interpretação que ele fez do Peter Pan no máximo "bonitinha". Mas esse pensamento dele colidiu com um assunto sério, que me preocupa há algum tempo.

Crianças.

O principal trabalho de cada criança é se preparar o melhor possível para a vida adulta.

Como crianças fazem isso?

Bem, escola é um bom princípio. Aprender a ler, escrever e conhecer o básico da nossa civilização é um excelente começo.

Mas escola ensina, não educa.

Educação é algo muito maior do que matérias que professores regurgitam todos os dias. Educação é algo muito mais amplo. Educação passa por conseguir descrever, interpretar, analisar, tirar conclusões, interagir e modificar o mundo ao seu redor.

Um adulto completo deveria ser capaz de entender e descrever as coisas pelas quais passa no dia a dia. Algumas descrições são questão de vida ou morte e devem ser efetuadas em frações de segundo, como identificar a cor do semáforo em um cruzamento agitado. Outras descrições são mais sutis, como a capacidade de ler emoções alheias corretamente, o que pode dar vantagens em relações comerciais, encontrar parceiros ou coordenar melhor trabalhos em grupo.

Um adulto completo deveria ser capaz de interpretar as descrições que faz. Entender que o vermelho significa "pare" e o verde significa "siga". Entender que uma pessoa triste talvez esteja precisando desabafar. Interpretar consiste em "preencher as lacunas" que a descrição não conseguiu alcançar. É encontrar os pontos não explícitos e conseguir criar um sentido mais amplo para o que está acontecendo. Interpretar corretamente os cenários dá subsídios para uma melhor tomada de decisão.

Um adulto completo deveria ser capaz de analisar as situações de acordo com a descrição obtida e com a interpretação efetuada. Uma análise bem feita permite que não apenas tomemos a decisão mais acertada, como permite a utilização da camada superior de raciocínio, aquela que abusa do bom senso para contrariar regras engessadas quando necessário, para o bem maior. Ver um sinal verde e analisar que os demais carros estão parados é o suficiente para você decidir atravessar o cruzamento em segurança. Mas uma criança correndo atrás de uma bola na calçada pode exigir que você analise os movimentos para prever se será necessário parar o carro para evitar um atropelamento.

Um adulto completo deveria ser capaz de extrair as melhores conclusões a partir das análises acertadas que fez com base em suas interpretações e descrições do mundo ao seu redor. Um guarda de trânsito que visse o motorista do parágrafo anterior parando em um cruzamento para salvar uma criança jamais daria uma multa por trancar o cruzamento para o motorista cauteloso. O bom senso fala mais alto do que qualquer regra engessada do código de trânsito.

Um adulto completo deveria se basear nesse tipo de conclusão para criar regras de convívio melhores, que consigam efetivamente evoluir nossa vida em sociedade. Criando novas ações que transformam o mundo para melhor.

As escolas até tentam estimular crianças nessas cinco habilidades, mas de longe não são o ambiente ideal para isso. 2021 rolando e até hoje temos professores mandando alunos calarem a boca em sala de aula, decorar tabuadas e perguntando quem descobriu o Brasil.

De qualquer forma, como já provou Daniel Kahneman, esse tipo de ensino apenas atinge a nossa "mente devagar". A parte do cérebro superior. A que tem alto raciocínio e alto custo calórico para ser mantida. Aquela parte do cérebro que presta atenção por apenas alguns segundos. Aquela parte do cérebro que custa tanto para o nosso corpo que o nosso corpo desliga ela sempre que pode.

O truque, segundo Kahneman, é utilizar essa parte superior para "treinar" nossa mente rápida. A mente rápida é uma mente mais instintiva. Mais emotiva, mais conectada com nossos desejos básico. Uma mente mais interessada em recompensas rápidas, em prazeres momentâneos. Uma mente que custa pouco e dá um resultado efetivo para o corpo. Uma mente que age por reflexo, dando respostas praticamente instantâneas para o que ocorre ao seu redor.

Em seu processo de educação para a vida adulta, a criança treina sua mente rápida através de brincadeiras. Através da fantasia, a criança se transporta para mundos e situações imaginárias. E por não compreender as amarras sociais dos adultos, as crianças se veem livres para segurarem gravetos e imaginarem espadas. Amarrarem um pano no pescoço e se imaginarem o Super Homem. Através desse mundo de faz-de-conta, crianças conseguem enfrentar situações que envolvem moral, ética e costumes. Ao imitarem seus heróis, elas vivem a carga de valores que eles possuem. Conseguem experimentar virtualmente as consequências das decisões que seus heróis tomam em um mundo protegido, longe das consequências do mundo real. E de fantasia em fantasia, meninos e meninas vão entendendo quais valores eles presam mais. Vão compreendendo as filosofias do que praticam. Vão encontrando aos poucos o seu lugar nesse mundo, formando a sua personalidade no processo.

Literalmente vão treinando sua mente rápida com fantasias geradas por sua mente devagar.

Bem, é fato científico comprovado que as brincadeiras de criança auxiliam não apenas os filhotes humanos como todos os demais filhotes de mamíferos superiores a se prepararem para a vida adulta.

E é ponto pacífico que precisamos proteger o tempo das crianças para que elas consigam se desenvolver o melhor possível.

Eu JURO que entendo e concordo com os progressistas sobre proibição de trabalho infantil. Lugar de criança é brincando, não exercendo algum trabalho remunerado.

Mas os progressistas não pararam por aí. Foram atrás das propagandas direcionadas para crianças. Na melhor das boas intenções, progressistas proibiram vendas direcionadas para crianças. E isso MATOU o patrocínio de programas de televisão direcionados para crianças em TV aberta. Não existe mais nenhum desenho transmitindo mundos fantasiosos, com personagens "do bem" lutando contra personagens "do mal".

As crianças ainda têm o TEMPO para gastar, mas tiramos dessas crianças as HISTÓRIAS que poderiam ser utilizadas nesse tempo.

Sem livros, sem desenhos, sem filmes e sem insumos para reger suas fantasias, crianças ficam à mercê do que está sendo passado para preencher seu tempo.

E o que temos oferecido para crianças é esse mundo cibernético das redes sociais e na TV um bombardeamento constante de sexualidade.

E é aí que a fala de Peterson faz sentido pra mim. Porque, se tudo o que oferecemos para crianças fantasiarem são situações sociais que elas ainda não compreendem e sexualidade, é claro que elas farão seus mundos de faz de conta a partir desses insumos.

E do mesmo jeito que eu, Arthur, me imaginava um He-Man, um Power Ranger ou o Homem Aranha quando eu era criança, porque esses eram os insumos que eu tinha para fantasiar, as crianças de hoje em dia olham a TV e têm a sexualidade como tema de fantasia.

Quando você menos espera, uma criança tá dizendo que é gay, bi, trans ou o escambau. E como o tema ainda é um tabu delicado, gera-se uma comoção.

Particularmente, eu gostaria de testar uma volta da publicidade voltada para o público infantil. Voltar a ter empresas de brinquedos anunciando bonecos e jogos nas manhãs das principais emissoras de TV. Ter novamente a TV Colosso, a TV Globinho, o Bom dia e Cia e toda sorte de desenhos na TV aberta. Crianças ocupando seu tempo com fábulas de heróis e princesas, em vez de ficarem fantasiando sua sexualidade aos 10 anos de idade.

Talvez isso pudesse gerar adultos mais preocupados em criar produtos e serviços mais úteis para a sociedade. E isso criasse uma geração que arregaça as mangas e faz, em vez dessa geração que faz filosofia e depois fica chorando nas redes sociais que não consegue fazer dinheiro suficiente para comprar uma casa, como seus pais fizeram 40 anos atrás.

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