terça-feira, 23 de agosto de 2011

Tanto por tão Pouco

O ativista indiano Anna Hazare foi solto. E, imediatamente, reiniciou seu jejum de protesto contra a corrupção na Índia.

Há várias coisas impressionantes nesse caso:

1 - A importância do indivíduo;
No nosso pais - o "Brasil, um pais para todos" - já nos acostumamos a não ver a importância do indivíduo. Nosso lema máximo de "venha se dar bem você também" nos fez um pais de "exxxpertos", onde cada qual busca a vantagem para si próprio, não vendo que, ao obter qualquer migalha de vantagem, está tirando dos outros. E, como já dizia o "Gabriel, o Pensador": "... cuidado com o branco aí do seu lado, porque, se ele precisar, te rouba e ta mata ...". O problema todo é que, para que um "exxxperto" ganhe algo, um "boboca" teve que perder. E isso, amigo, chama-se injustiça. E não há real democracia em um pais onde a justiça não prevalece. A justiça igual, correta. A justiça que não diferencia rico de pobre, branco de preto, homem de mulher, heterossexuais de homossexuais, "civilizados" de "silvícolas", etc, etc, etc... O conceito básico da cegueira da justiça, que só vê o certo e o errado.
Porque, avaliando friamente, cada Estado só existe porque seus cidadãos pagam por ele. Sim, o Estado é um serviço que todos nós sustentamos. E, como bons pagadores, temos o direito de consumir o que pagamos e o dever de preservar o todo, pois não é só nosso. Simples, justo. Assim sendo, o Estado tem o dever de prestar esses serviços aos seus clientes. Portanto, podemos dizer que cada cidadão é, em resumo, o resultado final do investimento do Estado. O Estado que arrecada impostos mais caros, teoricamente, proporciona serviços mais caros. Serviços mais caros geram cidadãos mais caros.
É a tônica da Guerra de Israel com a Palestina. Um cidadão Israelense demora muito mais tempo e é muito mais caro para ser formado do que um Palestino, porque o Estado de Israel investe muito mais em seus cidadãos, do que a Palestina.
<Parentese>
Em um primeiro momento, o exemplo acima nos induz a acharmos os Israelitas bons, e os Palestinos, maus. Vemos, claramente, a imagem de um jovem favelado Palestino matando a pedradas um Universitário Israelense.
Porém, eu creio que o maior problema, aqui, está no Estado mais bem formado, que investe mais no seu cidadão, não respeitando o Estado com mais problemas.
É aquele meio termo: não podemos nivelar por baixo as coisas, mas não pode-se exigir que uma criança discuta economia política com um PHD no assunto...
</Parentese>
Como creio que não preciso levantar a importância do indivíduo no plano pessoal, por sua obviedade, fica claro que cada pessoa tem a sua importância para o todo e o todo é responsável por cada pessoa.

Porém, esse ponto impressiona porque temos a Índia como uma pais pobre, terceiro mundo. Onde, assim como no Brasil - segundo a notícia - os cidadãos pagam por um Estado completo, mas não recebem, em troca, os serviços à altura.
E, mesmo com cidadãos menosprezados e abaixo do seu valor real, o jejum de um indivíduo incomoda a sociedade inteira.
Coisa que em nossa amada pátria passa em branco, como o jejum do padre nordestino contra a transposição do rio.
Aliás, passa batido todos os dias, todas as horas. Em auto-estradas inseguras, em não podermos sair mais à noite, em preços abusivos, em falta de saúde e educação, etc... 

2 - Como o Indivíduo consegue se sobressair;
A Índia trás para nós vários exemplos. É cultural: as pessoas têm valor, independente da economia que giram. E o seu valor aumenta conforme ele se doa para causas que favorecem mais e mais pessoas.
Isso é, talvez, o que mais sinta falta no Brasil: pessoas sendo valorizadas pelo que são, não pelo que têm.
Atendo a um cliente que é "grosso". "Ignorante" talvez seja até cabido. Uma pessoa que aprendeu a ganhar na vida através do "marretaço" e da "exxxperteza". Uma pessoa que, ao ver alguém que estudou, automaticamente passa a atacá-la. Frases como "Eu consegui isso tudo sem estudo, e tu? O que conseguiu com tanto estudo?".
Esse exemplo mostra algo que acontece todos os dias, em maior ou menor intensidade, em todos os lugares.
E não é de se espantar, ainda mais aonde a carreira de futebolista é mais valorizada e buscada que qualquer outra...

Não que a erudição seja parâmetro para que uma pessoa seja mais ou menos do que outra. Mas a compreensão de si próprio leva a pessoa mais longe nos caminhos em que ela escolhe.

E se o meu cliente fosse mais instruído? Será que não utilizaria processos melhores e, consequentemente, seria mais ainda do que já é?
E os tantos casos de verdadeiros filósofos que temos, parados, inertes, dentro de casa, sem capacidade de fazer alguma coisa por si e pelos outros? São mais do que os que não estudaram mas conseguiram fazer algo de bom para todos?

O valor de cada pessoa é um cálculo complicado, que leva em conta tudo o que a pessoa faz e representa. Tudo o que a pessoa quer e luta para si e para os outros. Tudo o que a pessoa absorveu, construiu e legou aos demais.

E esse valor só pode ser visto em sua totalidade com muita sensibilidade. Com muito estudo. Com muito suor. E, depois de tudo isso, passarmos, na pele, por tudo que os outros passaram.

E é isso que espanta na Índia: Como uma pessoa sem acesso à educação, sem oportunidade de fazer as coisas e sem importância para a sociedade consegue chamar a atenção?
Cultura. O paradigma que falta mudarmos em nosso pais-colonia. Somos um mero mercado fornecedor de matéria-prima barata e consumidor de bobagens industrializadas para a economia mundial. Um bando de crianças que se mata para ter brinquedos legais que, muitas vezes, nem sabem usar direito... em troca de tudo o que é realmente importante.
Nós, essas crianças, nos acostumamos a viver de intrigas internas e esquecemos de "acontecer". Passamos uma vida nos preocupando com o fútil, relegando ao quinto plano o essencial.
Cuidamos mais dos bens materiais e de animais do que de pessoas, crianças, idosos, doentes...

3 - Porque do protesto;
O senhor Anna Hazare está jejuando em protesto contra a corrupção. A causa de todos os males de países subdesenvolvidos, onde o povo é formado artificialmente, sem identidade que reúna-os em torno de um ideal.

África, de modo em geral, por exemplo. Milhares de tribos unidas, artificialmente, em um único pais. Tribos que, diversas vezes, sequer conseguem conviver. Quando uma tribo vai ao poder, massacra a(s) rival(is) e favorece indiscriminadamente a sua.
Em países da Ásia, onde a mão de ferro ainda toma conta, subjugando o próprio povo, forçando-o a uma existência de duras penas para sustentar um Estado que nada favorece o cidadão...
E a América Latina em geral que, tomada pela necessidade Norte-Americana e Européia, continua sendo uma colonia.

A corrupção se encontra em todos estes locais porque o Estado não está voltado para os cidadãos mas, sim, para defender interesses de uma minoria. 

No Brasil, temos diversos estágios diferentes de corrupção:
Corrupção feudalista/coronelista do Nordeste, onde, por exemplo, o Clã Sarney manda e desmanda, faz chover e exige oferendas de seus fiéis;
Corrupção institucional, comum no planalto central, onde os cargos públicos são ganhos por indicação e parceria, onde o dinheiro público é repartido entre aliados e as leis são feitas somente para benefício de quem as redige.
Corrupção de financiamento, onde empresários "investem" na compra de cargos públicos para que os seus "funcionários" criem leis, favoreçam licitações e protejam o mercado de seus negócios, custe o que custar.

Coisas que não sei se são comuns ou iguais na Índia, mas que têm a mesma consequência: desrespeito e abandono do cidadão.

Como a improbidade administrativa do próprio Sarney, por ter utilizado veículos públicos para fins pessoais (também quero usar os carros da polícia como táxi...);
Como a liberação de múltiplos salários para funcionários públicos que exercerem múltiplas atividades (Como assim? Porque não contratam várias pessoas para os cargos logo? E, se uma pessoa só pode fazer todos os trabalhos, porque as tarefas não são unificadas para um único servidor exercê-las?)
Como cada desvio de verba pública descoberta e julgada não resulta em devolução dos valores (Te roubam, processam o ladrão, mas ele NÃO TE DEVOLVE O QUE ROUBOU? Que raio de justiça é essa?)


A cultura aqui é diferente da cultura indiana. Lá, um protesto pacífico é suficiente para que as pessoas se mobilizem, para que o governo sinta a ação e para conseguir mudar algo. Aqui, isso seria motivo de riso. Chacota até dos próximos. Institucionalizou-se que o cidadão não detém poder algum e, assim, continuamos pagando impostos, comprando, assistindo ao futebol e à novela, como se fossem as coisas mais importantes do mundo.

Falta. Faltam pessoas que se doam e, em vez de criarem "ONG's", passem a atacar a politicalha e as leis sem sentido do nosso pais. Falta criarmos um novo conceito de Brasil. Uma identidade nacional que não dure o tempo de uma Copa do Mundo.

Falta a disposição de morrermos pelo que acreditamos.

Att.
Arthur Tavares

"Quando a necessidade e a perfeição são inimigas, há algo errado."

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