Quem tem conteúdo, tem. É tão perceptível, palpável e confirmável logo à primeira vista, que chega a arder os olhos.
O semblante, as atitudes, a mais singela saudação... O conteúdo se faz tão evidente que força a sua entrada na nossa percepção.
E você pode até não concordar com o conteúdo que preenche a mente alheia. Mas, mesmo quando você acha o conteúdo alheio errado, você é forçado a concordar, pelo menos, que ali do outro lado há alguém com quem debater ideias.
Na arte o conteúdo é imprescindível.
Desculpem-me os adoradores das músicas feitas para "rebolar até o chão", mas a música deve ter um mistério. Devem existir pistas ocultas nas entrelinhas, que te levem a um sentido maior. A letra deve criar pontes entre diversas ideias e a melodia deve servir de veículo que te conduza neste percurso.

E, nos últimos dias, eu tenho notado que o ápice desta descoberta de pistas sobre o conteúdo contido em músicas está nas gravações de shows ao vivo.
Não se trata da catarse das emoções da multidão com o artista, unidas em egrégora. O movimento tribal gerado pelo show é contagiante e incrivelmente prazeroso, sim. Mas as apresentações ao vivo nos proporcionam os pequenos discursos nos micro-intervalos entre as canções.
Escute o CD duplo "Platéia ao Vivo" da Legião Urbana...
Ou procure por "StoreFront Hitchcock" ou pelas apresentações de Tim Mintchin no Youtube...
Até o "Bullet in a Bible" do Green Day é fantástico nesse sentido.
O que o artista fala naqueles segundos entre uma música e outra revelam muito de sua personalidade. Às vezes eles "entregam o ouro", falando diretamente o sentido total de alguma composição. O Renato Russo fez isso no Acústico MTV... E a música "Teatro dos Vampiros" NUNCA MAIS foi a mesma...
Mas, mesmo assim, essa conversa mais íntima com o autor que tem conteúdo é fantástica.

Ontem à noite, o Humberto Gessinger foi atração da noite, na Feira do Livro de Novo Hamburgo. Não, ele não tocou nenhuma música. Ao invés disso, ele fez um show muito melhor: manteve uma conversa/entrevista com o público, durante cerca de uma hora e meia.
Cada detalhe que ele nos entregou ontem a noite fez com que muitas lacunas sombrias de suas músicas fossem iluminadas.
E essas lacunas preenchidas nos mostram em qual grande grupo de temas do conhecimento humano, a obra está se intrometendo na discussão.
O fato é que, nestes tempos de convergência de mídias em volta de um mesmo tema de entretenimento, um artista antenado vai além da letra e da melodia. Um artista antenado estrutura a obra musical de tal forma que instigue o espectador a ler o blog. A acessar o site, participar da TwittCam, ler o livro, jogar o jogo, ir ao show, ver a entrevista, o seriado e ao filme.

Em resumo, quando uma obra é pensada e suada pelo seu autor, ela provoca o desejo de leitura e releitura por parte do expectador. E essas leituras e releituras geram novas interpretações da obra, que podem se tornar novas obras, com sua própria importância na discussão geral.
Uma música bem feita pode levar centenas de pessoas em uma noite fria até um parque, para ver o autor simplesmente falar dela.
E, sim, essa noite foi fantástica. Quem não foi, perdeu.
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