segunda-feira, 28 de outubro de 2013

Responsabilidade Emocional

Há uma linha tênue no meu cérebro. Uma linha de nylon extra-fina e transparente, daquelas invisíveis enquanto esticadas em um belo dia de sol de verão.

Essa linha divide os conceitos de controle absoluto e de liberdade absoluta.

Porque, para mim, não há meio termo nesta dualidade. Ou o ser humano é livre por completo, ou está sendo controlado por completo. Dizer que você pode fazer tudo o que quiser, exceto alguma coisa, já é uma forma de te controlar absolutamente. Ao perderes a liberdade absoluta, já és um escravo. E não existem "meios-escravos".

Desculpem minha falta de modéstia, mas eu penso. Penso muito, penso em temas mais importantes e penso mais do que a esmagadora maioria de vocês. Enquanto vocês perdem tempo com BBB's, eu estou lendo conteúdos para saciar minha sede de conhecimentos. O problema é que cada nova resposta se mistura com o que eu já sabia antes, gera novos pensamentos e, com eles, aparecem novas perguntas.

"Só sei que nada sei" é uma falácia. Sabemos muito, mas cada novo conhecimento aumenta o nosso horizonte de coisas que não sabemos. E não é porque enxergamos quilômetros de dúvidas, que vamos desprezar nossos metros de conhecimento.

O resultado de todo conhecimento acumulado até hoje, somado à minha tendência de me apaixonar por utopias, resulta em um Arthur apaixonado pela liberdade. Pelo liberalismo. Pela luta incessante de prover uma linha de largada justa para todas as pessoas e, dali em diante, que cada consciência guie cada indivíduo pelo caminho que melhor lhe convier.

Sem eleitos, sem beneficiados, sem proteção, sem "coitadismo", sem bolsa-família, seguro desemprego ou qualquer outro tipo de passada de mão sobre a cabeça. 

Mas...

Como já falei ali em cima, isso é uma utopia. Não, não é culpa do capitalismo, dos governos ou de qualquer outro fator externo. A liberdade total é uma utopia por que o ser humano não é capaz de cumprir as exigências para ser livre de verdade.

Nós, seres humanos, somos animais. E engana-se quem afirma que somos animais racionais. Nós temos só uma parte do nosso cérebro racional, e essa parte racional não está no controle das nossas ações! A maior parte do nosso cérebro ainda é primitiva, instintiva, irracional, egoísta, auto-preservativa, ignorante, entregue às sensações mais básicas e profundamente estúpida.

Amigo, vamos deixar claro que precisamos estabelecer o pacto social para conseguirmos chegar à esta MERDA DE SOCIEDADE que temos? Sim, como diria o Agente Smith em Matrix, estamos no auge da nossa civilização. Nunca o ser humano viveu tanto e tão confortavelmente. Nossos mendigos de rua têm qualidade de vida maior do que muitos cidadãos trabalhadores da idade média. Mas, mesmo assim, nossa sociedade é uma piada. Ainda hoje pessoas morrem de fome e o problema não é falta de comida, mas a péssima logística de transporte de mantimentos, unida com políticas esdrúxulas e a sede por lucro de políticos corruptos e das grandes empresas.

O ponto é que se não fossem as leis que dissessem que uma pessoa não pode roubar ou matar outra pessoa, as pessoas estariam vivendo em um regime pós-apocalíptico, protegendo os poucos bens que lhes dão conforto com as próprias vidas! Cada um viveria dentro de sua própria gaiola, tentando isolar o resto do mundo do interior da sua propriedade...

OH WAIT A SECOND!!!

O que eu estou tentando mostrar é que nós não fomos feitos para desfrutarmos da liberdade total. Nós somos macacos usando sapatos. O Gabriel, o Pensador cantou certa vez que "E cuidado com esse branco aí parado do seu lado / Porque se ele passa fome / Sabe como é: /
Ele rouba e mata um homem / Seja você ou seja o Pelé". Tá certo, a música "Lavagem Cerebral" era sobre racismo... Mas essa frase é universal: quando nossas necessidades não são atendidas, nós nos transformamos em tudo o que há de pior.

Você lembra da pirâmide das necessidades, né? Necessidades fisiológicas -> Segurança -> Social -> Estima -> Realização. Experimenta tirar qualquer uma das bases de sustentação dessa pirâmide de alguém, para ver se o indivíduo não pira na batatinha e não se perde...

Portanto, amigo, a liberdade absoluta é um jogo perigoso. Ela exige que você TENHA CONHECIMENTO e SAIBA PENSAR, para que você possa usufruir de todos os benefícios.

E esses pré-requisitos são, por si só, já um tipo de limitador de liberdade: para que a sociedade se sinta segura, todos devem pensar de modo similar. E, para garantir isso, os mais velhos incutem na educação dos mais jovens os pensamentos que desejam que a próxima geração tenha. "Programamos" o pensamento das nossas crianças, para que (pelo menos a maioria d) elas creditem valor aos conceitos que nós damos valor.

Então, uma vez um novo adulto formado com o pensamento padronizado do nosso modo, damos-lhe liberdade. A liberdade total para fazer tudo o que nós colocamos na cabeça dessa pessoa que ela poderia fazer.

E, amigo, isso não pode ser muito diferente, não. Como disse lá em cima, a liberdade total é uma utopia. Porque, na liberdade total, a única coisa que te impede de me matar é o teu discernimento se isso é uma coisa certa ou errada a ser feita. E o único modo que descobrirmos para garantirmos as nossas vidas é incutirmos uns nas cabeças dos outros que matar pessoas é errado...

Ou seja, não somos responsáveis o suficiente. Não temos conhecimento o suficiente. Não processamos os parcos conhecimentos adequadamente. E, definitivamente, não tomamos atitudes inteligentes por falta de base.
Portanto, nós não estamos prontos para vivermos em um ambiente de liberdade total. Infelizmente, precisamos de leis, de regras e de lavagens cerebrais para conseguirmos co-existir.

Queres ver um exemplo desta dualidade?

Relacionamentos amorosos nos nossos dias.
O envolvimento íntimo é uma coisa tão importante na pirâmide de necessidades, que aparece em todos os seus estágios.
Fisiologicamente, o sexo é uma atividade instintiva importante para cada ser humano.
A Família constituída a partir do relacionamento garante Segurança para o indivíduo.
E uma família bem constituída já supre as necessidades sociais do indivíduo, também.
Um relacionamento coeso satisfaz todas as necessidades de Estima.
E, caso o relacionamento esteja no centro de sua vida, ele pode satisfazer sua necessidade de realização de vida.

Mas, mesmo sendo tão importante, damos total liberdade para todos os indivíduos, de todas as idades, para escolherem seus parceiros, lidarem com a sua sexualidade, escolherem os métodos de condução do relacionamento e para, inclusive, terminarem os laços do modo que acharem melhor.

Ao fazermos de um copo d'água, de um prato de comida, de uma cama para dormir ou de um teto para nos proteger algo diferente de uma pessoa que nos ame, estamos banalizando toda a pirâmide de necessidades dos indivíduos.
Desestruturamos de tal modo, que muitas pessoas passam a desacreditar os relacionamentos amorosos, apenas utilizando-os para atenderem suas premissas fisiológicas.

Quem aqui nunca ouviu as frases estúpidas:
1 - "Não fico com o porco inteiro só por causa da linguiça!";
2 - "Pra que comprar a vaca inteira se eu posso só tomar o leite de graça?".

Um relacionamento é coisa séria. Tão séria que deveria ser parametrizado. As pessoas deveriam ter mais auto-conhecimento. Saberem daquilo que buscam para suas vidas.
Mas, como já mostrei, as pessoas não têm conhecimento. E não conseguem pensar o suficiente sobre o pouco que têm, para criarem suas próprias conclusões em harmonia com as demais.

Entenda: eu sou um utópico. E gosto da ideia de liberdade total. Aliás, está me doendo escrever contra a utopia de um mundo realmente livre, aqui. Mais uma vez o peso da realidade cinza e cruel está esmagando meu sonho leve e colorido.
Mas o fato é que o amor é mais do que a coceira no seu órgão genital. O amor é mais do que encher uma casa de pessoas com quem tu se sente bem. O amor é mais do ter iterações sociais, de estima ou de auto-realização.

Um relacionamento afetivo bem construído pode ir além de atender necessidades e gerar uma vida maravilhosa para os envolvidos.

O importante é que as pessoas entrem no relacionamento com os mesmos objetivos. Com as mesmas intenções.

E essa isonomia de interesses emocionais é tão importante, que é insano darmos tanta liberdade sentimental às pessoas, sem a devida instrução prévia.
E aí entra, novamente, a dualidade: incutimos os valores nas cabeças dos jovens, para que eles vivam de acordo com a nossa cultura, ou nos esforçamos para dar (a quase todos) eles as bases sólidas a partir das quais conseguiriam ter relacionamentos sadios.

E porque eu tenho tanta preocupação com esse tema? Por que, amigo, ainda existem "ladrões de galinha", sim. Gente que rouba para dar de comer para seus filhos. Temos criminalidade por causa de drogas e confronto de cartéis, também.
Mas a enorme maioria dos crimes que acontecem no mundo inteiro são passionais.

Pessoas perdem a cabeça com relacionamentos instáveis. Produtividades são desperdiçadas pelo tempo com tratativas em relacionamentos desiguais. Existem milhões de pessoas sofrendo dentro de relacionamentos, porque o casal se ama, mas não são feitos um para o outro.
E, quando um destes relacionamentos acaba, o sofrimento é compartilhado entre os dois. E triste do casal que teve filhos, porque o sofrimento escorre para a próxima geração, também.

Aliás, já foi comprovado que a maior parte dos mendigos masculinos são, apenas, homens que tiveram o coração partido, não seguraram o tranco emocional, caíram em uma depressão, perderam o emprego, se entregaram a vícios, etc...
O surto de depressão que o mundo está sofrendo não tem sua causa muito longe da decepção amorosa. Nossas vidas são vazias e, se não encontramos alguém por quem vale a pena morrer, sentimos-nos inúteis, dispensáveis... "Só mais um no meio da multidão".

Agora, se o indivíduo não tem um bom preparo psicológico, vemos diretamente sequestros, violência, agressão, suicídios e assassinatos, mesmo. De uma hora para outra a pessoa que tanto fazia bem se transforma em uma fonte de dor. O mundo inteiro cai, as metas pelas quais valiam a pena morrer perdem completamente seu sentido, as perspectivas se esvaem e não dá mais para ver o futuro, pois este fica turvo...

Eu gostaria de viver em um mundo aonde todos nós soubéssemos, instintivamente, viver de modo harmonioso. Aonde bastasse olhar no rosto da outra pessoa para saber de suas intenções. Aonde o conhecimento fosse realmente valorizado por todos e todas as nossas conclusões fossem parecidas.
Mas a verdade é que não somos assim. A verdade é que somos animais irracionais na maior parte do tempo e precisamos de adestramento para vivermos em sociedade.
E no que tange relacionamentos amorosos, a saída, por enquanto, é buscarmos pessoas que tenham um adestramento parecido com o nosso. Assim, podemos já começar um relacionamento aonde os dois queiram satisfazer os mesmos itens da pirâmide de necessidades. Ou, pelo menos, que ambos respeitem a busca do parceiro.
Porque, quando os objetivos no relacionamento são dissonantes demais, não há boa vontade, sentimento ou trabalho árduo que façam com que o relacionamento atenda às necessidades dos dois.

4 comentários:

  1. Compartilho de pensamento similar atualmente, tanto que me veio a definição: "somos animais reacionais". Acrescentando-se um "e" nos definimos com maior fidedignidade. Achei o texto excelente para reflexão.

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  2. Tem um filme que fala "somos macacos de terno, implorando pela aprovação dos outros...". Filme Revolver. Somos animais, pouco racionais e uma "prova" do nosso parentesco com outros primatas é, por exemplo, o formato de nossas mãos. Se parecem com as mãos de um chimpanzé, por exemplo.

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  3. Acho que a maioria de nós confunde um senso de responsabilidade com uma cobrança interna, um medo de punição externa ou a pior delas: a autopunição psicológica. Ainda parte do nosso adestramento.

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  4. Acho que a maioria de nós confunde um senso de responsabilidade com uma cobrança interna, um medo de punição externa ou a pior delas: a autopunição psicológica. Ainda parte do nosso adestramento.

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