sexta-feira, 1 de novembro de 2013

Independência é uma Doença

- “Nenhum homem é uma ilha isolada; cada homem é uma partícula do continente, uma parte da terra; se um torrão é arrastado para o mar, a Europa fica diminuída, como se fosse um promontório, como se fosse a casa dos teus amigos ou a tua própria; a morte de qualquer homem diminui-me, porque sou parte do gênero humano. E por isso não perguntes por quem os sinos dobram; eles dobram por ti”. 

John Donne (1572-1631), o mais notável dos Poetas Inglês metafísico. 



Primeiro, quero dizer que em um aspecto da minha vida, ao menos, estou extremamente feliz. Estes textos tem UMA ÚNICA E EXCLUSIVA PESSOA a quem são endereçados. E fiquei sabendo DIRETAMENTE DELA que ela os lê. Um sonho realizado, um desejo satisfeito, uma meta atingida. Faltam algumas milhares de metas, uns milhões de desejos e uma pequena infinidade de sonhos para que eu possa ter paz.

Mas vamos ao tema. Porque ele é importante.

Ser independente é uma doença. Mental e grave. E é uma doença que possui estágios. Quanto mais independente a pessoa (se diz que) é, mais afundada nesta doença ela está.

Eu chego a dizer que a independência é uma doença mais grave do que a carência.

Eu poderia fazer todo um rodeio imenso, aqui, citando características biológicas, evolutivas, sociais, mentais, clínicas e afetivas, para embasar essa minha opinião. Mas eu vou encurtar essa parte do meu texto. Ela é chata e exige muito estudo prévio em temas polêmicos para que sejam compreendida. Resumidamente:

Somos seres sociais. Certeza biológica. Não acredita em mim? Estude os primatas. Olhe nossas cidades. Veja a pré-história contada pela nossa evolução. O homem só conseguiu atingir todo o seu potencial ao constituir aldeias cada vez maiores, até nos tornarmos uma aldeia global.
Nosso cérebro foi construído através de milhões de anos de evolução para trabalharmos em equipe. Nos coordenarmos. As duas primeiras coisas que ensinamos às nossas crias é a andar e falar. Duas das coisas mais importantes para a vida em sociedade.
Nós adoecemos ao nos isolarmos. E isso é comprovado cientificamente. Não sou eu quem está falando. Nosso cérebro é menos ativo, se desenvolve menos e tem ideias piores, quando nos encontramos afastados dos demais.
Isso sem falar das nossas necessidades afetivas. Sem pessoas por perto, entramos em depressão. Depressão pode levar à obesidade ou anorexia e a todos os problemas consequentes de cada uma dessas moléstias.

Estou escrevendo este texto por ter escutado que "sou carente demais e preciso de tratamento médico".

Tá certo. Concordo que não seja saudável gostar de alguém, ao ponto de pensar que nunca nos separaremos. E, com base nesse pensamento, concordo que não seja saudável também sentir-se seguro o suficiente para se entregar completamente ao relacionamento. E, com essa certeza em mente, assino em baixo que é quase maluquice confundir e substituir os próprios objetivos de vida, com os objetivos do relacionamento.

Mas vamos concordar que isso que eu acabei de descrever é o que mais acontece? Aliás, é o que mais acontece porque é o normal. É o necessário para que duas pessoas formem uma família, criem nossa próxima geração e, assim, mantenhamos nossa sociedade estável!

Quando recusamos a aceitar a carência que temos dentro de nós, passamos a destruir esse conceito de grupo, de sociedade, de família e de continuidade.

Exemplo prático da hipocrisia de alguém independente demais: Não adianta reclamar de alguma criança mal-educada na rua. Essa criança é resultado, justamente, da falta de carência dos pais. Da independência exagerada deles. Pessoas carentes precisam das demais pessoas. E, por precisarem, sabem exatamente no que precisam colaborar para efetuarem a "troca sentimental" de que tanto precisam. 

Pessoas independentes não precisam dessa troca. Ou fingem muito bem que não precisam. Ou recebem tanto sentimento sem precisarem se esforçar, que não dão o menor valor às pessoas que as oferecem - com muito esforço e de bom grado.
Pessoas independentes acabam tão bem supridas de sentimentos, que seus cérebros não precisam se preocupar com as trocas sociais. Eles não precisam garimpar sentimentos, transformarem sentimentos brutos em sentimentos refinados, promover uma logística de distribuição, montar a estrutura de venda e, enfim, entregar para o consumidor final.

Pessoas independentes demais não sujam as mãos com sentimentos, pois são tão ricas nesse quesito que acendem cigarros com seu bolo de notas de amor...

A carência pode parecer uma coisa ruim. Mas é vital para que consigamos manter a coesão entre as pessoas.
A independência pode parecer algo fantástico. Mas ela separa, destrói, afasta e, não satisfeita, deixa uma trilha de corpos emocionais por onde passa.

O fato é que há algo de errado com quem é independente demais. Seja nas causas, no modo como a pessoa foi criada, na filosofia de vida que essa pessoa segue ou até mesmo na sua aparência. Ou, ainda, pode ser uma mentira muito bem arquitetada. Fingir-se de independente pode ser uma estratégia de uma pessoa muito mais carente que todas as demais. Uma pessoa que tem tanto medo de se machucar, que prefere não receber nenhuma espécie de sentimento. Pelo medo de ser assaltada e ter sua moeda-amor roubada, ela opta por manter uma aparência de milionária, mesmo sem ter nenhum centavo-sentimento. E, justamente por não aceitar dos demais, essa pessoa não tem moeda-sentimento para oferecer aos demais. Fico imaginando o sofrimento que passa essa pessoa, a cada segundo de cada dia.

Talvez essa seja a única explicação para que uma pessoa seja tão independente: como ela não aceita os cuidados dos demais, precisa obter os cuidados dela própria. Assim, fecha-se o ciclo. A independência torna-se uma doença que se retro-alimenta. O medo de se machucar faz a pessoa afastar os demais. Não recebe o afeto dos outros. Passar a produzir seu próprio afeto, sozinha. Cria a ilusão de que não precisa do afeto dos outros. Afunda-se nesse ciclo.

Mas tanto faz se a independência é verdadeira ou mentirosa, o resultado dessa doença é o mesmo: a pessoa passa a desprezar o sentimento alheio. O mundo à sua volta fica frio, analítico demais aonde deveria ser extremamente emocional. E essas pessoas passam a ver o comportamento dos carentes como sendo anormal ou doentio.

O carente apenas tem devoção aos alvos de seu sentimento. E isso quer dizer que qualquer burrada (dessas que acontecem na vida) que um carente faça para os outros não será repetida para a pessoa a qual gosta tanto...

Se um carente deve se tratar para aprender se gerenciar para aproveitar melhor suas poucas emoções, os independentes também devem se tratar, para aprenderem a gerenciarem melhor as muitas ou nenhuma emoções recebem dos outros...

Independente: "você não é uma ilha... os sinos dobram por ti"...

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