sábado, 24 de março de 2012

Não, Não tem graça.

O cenário cultural do Brasil anda complicado.

Consumimos muita cultua importada. Confesso. Também gosto e consumo. O que tem qualidade agrega, né?
Só que um fenômeno tem ocorrido: nós não nos consideramos produtores. Para falar a verdade, vivemos uma vida de meros espectadores do que jogam na nossa cara. Aceitamos de bom grado qualquer porcaria que nos mostram e não nos mexemos para criticar e criar a nossa própria visão do mundo.

E, quando nós não temos nossa própria visão de mundo, outras pessoas que têm, acabam ocupando o espaço vazio das nossas cabeças, com as ideias que favorecem-nas.

Isso, amigo, é a exemplificação do processo de emburrecimento da população e criação da "opinião pública".

Quando não pensamos sozinhos, terceirizamos nossas opiniões para o que a alcateia está bradando. E, ao sermos mais uma voz no coro, ajudamos a criar o mesmo efeito em outras pessoas.

Uma multidão que grita, agonizante, sem saber o que ou porque está ali, berrando.

Não faz muito tempo atrás, Rafinha Bastos foi execrado por uma piada boba. Uma piada tão ridícula que o esquecimento já seria punição suficiente. Mas não. A opinião pública do "politicamente correto" caiu sobre o humorista. Concordo que o humorista não teve bom discernimento. Eu, que não sou humorista, jamais afirmaria que "comeria uma mulher e o bebê que ela carrega". No mínimo estúpido. Mas foi feito em nome e momento de humor. E assim deveria ter sido tratado: humor sem graça.

Eu tenho comigo que humoristas devam ser livres, para poderem expressar o que acharem relevante para nos fazer rir.
Mas é complicado, hoje em dia, pedir isso. Com tanta censura da opinião pública, nenhum humorista pode utilizar estereótipos. Falar de mulheres, negros, políticos, doentes, índios, crianças, velhos, pobres, ricos, etc...

Cedo, vendo a MTV, vi um anúncio de um programa de humor. Em um sofá, alguém fingia que tocava violão, enquanto uma mulher fingia que cantava. A cena era péssima. Estridente. Desafinada. Fora de tom. Tando que a terceira pessoa da propaganda - que estava entre o violeiro e a cantora - chegou a se retirar no meio do anúncio. Péssimo. 

Fui ao twitter e publiquei:


O Pc Siqueira retuítou.
Depois, foram mais de mil RT's. Tive que me explicar e conciliar com quase 10 pessoas, que acham que o humor, hoje, no Brasil, está ótimo.

Mas eu não tenho como concordar com isso. 

Em meados do século passado, a ditadura era ríspida, no Brasil. As pessoas não podiam falar, abertamente, o que pensavam. E a comédia, meus amigos, é justamente fazer graça com o que se pensa.

Ontem, morreu o Chico Anysio. Um mestre em fazer com que a tristeza fosse embora. Tão mestre, mas tão mestre, que preparou o Brasil inteiro para que a sua partida não fosse triste. Sério. Depois de 110 dias de internamento, ele conseguiu fazer com que algumas pessoas ficassem até consoladas, porque o sofrimento dele havia acabado.

Criador de mais de 100 personagens, ele sempre foi ótimo em criar a piada que força você a pensar:
Cliente: "Garçom, essa linguiça é de porco?"
Garçom: "Sim, é linguiça de porco!"
Cliente: "Então eu não vou comer essa linguiça!"
Garçom: "Qual o problema com ela, senhor?"
Cliente: "Eu não sei a procedência dela!"
Garçom: "Ah! O senhor gosta de saber de onde as coisas vieram?"
Cliente: "Sim!"
Garçom: "Então espere um minuto que eu vou lhe trazer dois ovos!"
Cliente: "Tudo bem!"

Eu morro rindo. Mas, nos dias atuais, nossa população incapaz de pensar não vai entender essa piada. Ou, se entenderem, não vão notar tudo o que está por trás dessas frases, simples. Toda a crítica social.
E, como não há estereótipos, ali, a nossa população não tem o que julgar. O texto é limpo e altamente crítico, ao mesmo tempo. Só que precisa de inteligencia para notar e rir.

Gostaria que o Brasil voltasse a produzir material de qualidade, assim.
Mas, com nossos gênios se despedindo, cada dia parece mais impossível.


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